domingo, 30 de setembro de 2018

Exu Cigano

O Rei da Magia e da Sedução.

"Eu trabalho na energia das duas bandas: A Banda da Direita e a Banda da Esquerda. Eu tenho obrigação de atuar na Esquerda como Exu, como primeira energia. Mas, em meus trabalhos, complemento minha ação com a energia da Direita. Isso quer dizer que em meu trabalho como Exu Cigano, eu posso atuar em todas as Linhas da Direita ou da Esquerda simultaneamente.
Por exemplo, se realizo um trabalho de cura, utilizo a vibração de Exu e de Oxóssi; se realizo um trabalho de limpeza, minha vibração exigirá a atuação das Mães d'Água; se realizo um resgate no Plano Espiritual, pedirei auxílio à Obaluaiê... Dessa forma, nunca estarei sozinho ou desamparado.
Agora que expliquei como desenvolvo meu trabalho, contarei a história de minha penúltima encarnação. Eu sei que, normalmente, relatamos nossa última existência... Mas, minha última vida foi uma vida comum de alguém que viveu para quitar uma dívida Khámica. Quitei a dívida e pude trabalhar nesse lado de cá como Exu Cigano.
Em minha penúltima existência terrena, nasci na Itália do século XVII, junto ao Povo Calon. Para quem não sabe, os Calon representam uma das Raças Ciganas, junto ao Povo Rom, Sinti e outros... Nós também somos chamados de Kalé. Eu nasci na Época da Inquisição Europeia e de uma forte perseguição aos Povos Ciganos. Por conta disso, estávamos sempre nos mudando e viajando por territórios desconhecidos. Meus pais eram negociantes de peças de couro curtido, de várias origens.
Desde muito cedo eu aprendi a manejar facas, adagas e punhais com muita maestria. Eu era um exímio atirador à distância. Por isso, me chamavam de Zumavipe, que quer dizer desafiar... Eles acreditavam que bastava me desafiar para eu ganhar. E era verdade. Quanto mais desafiado eu era, mais eu me superava.
Os anos passaram e nós conseguimos nos esconder da Inquisição. Eu tornei-me um homem e herdei os negócios de meu pai, me casei e tive dois filhos (um casal). Eu tinha muito orgulho de minha gente e de minha família. Um dia, porém, tudo mudou... Estávamos acampados numa região onde, hoje, se localiza a Bélgica. Na época essa região era chamada apenas de Países Baixos, por agrupar diversos territórios.
Nesse local, fomos delatados e aprisionados. Durante a luta, eu sozinho com meus punhais, consegui matar setenta homens. Mas, eles eram mais de quatrocentos e em pouco tempo fui rendido... Nós fomos levados à sede da Inquisição, na Espanha. Fomos julgados e condenados ao cadafalso. Morremos todos juntos, inclusive meus filhos - tão pequeninos e inocentes...
Ciganos, piratas, feiticeiros, rebeldes ou todos aqueles que se opusessem à Coroa e à Igreja (qualquer Igreja) eram condenados. Forca para traição. Fogueira para bruxaria. Decapitação para os blasfemadores. Esquartejamento para os líderes de rebeliões. E tantas outras formas de condenação. Eles eram bastante criativos quando se tratava de condenar...
Na minha última existência nasci e morri como escravo em terras brasileiras. Agora vocês entendem porque sou um Exu e entendem porque sou um Cigano."

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Cosme, Damião, Doú, Talabe, Alabá, Crispim e Crispiniano.

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Os Ibejis de Umbanda seguem o sincretismo dos Erês de Candomblé. No Candomblé, os gêmeos Erês são filhos de Xangô com Iansã (Yansã). Os sete Ibejis de Umbanda seguem uma tradição muito antiga, baseada numa Lenda que conta a história de São Cosme e São Damião.
No Candomblé, é de conhecimento que Xangô e Iansã (Yansã) tiveram, primeiramente, Taiwó e Kehindé; depois, nasceu Odowú. Taiwó morreu afogado. Kehinde morreu de tristeza e Odowú caiu doente de saudade dos irmãos...
Já a Lenda dos Sete Irmãos, conta que a mãe de São Cosme e São Damião teve mais 2 filhos gêmeos: Crispim e Crispiniano; que também seguiram os passos dos irmãos mais velhos, Cosme e Damião, seguindo o Cristianismo... Além dos 4 filhos gêmeos, ela teve outros três: Talabe, Alabá e Doú. Mas, os registros históricos referem-se aos irmãos de Cosme e Damião, como: Antimo, Leôncio e Euprepio. Sendo Crispim e Crispiniano de outra família...
E de onde surgiram os sete nomes? Os nomes Cosme e Damião são de origem Ciliciana. Doú provém de Idowú, de origem Africana. Crispim e Crispiniano são de origem Romana. Talabe provém de Talab, do Oriente Médio. E Alabá possui sua origem no Árabe - Allah Abba. Talabe e Alabá são, provavelmente, uma referência aos locais de peregrinação dos irmãos Cosme e Damião.
A história relata que Cosme e Damião eram médicos que se converteram ao Cristianismo e auxiliavam os pobres, principalmente, idosos e crianças. Crispim e Crispiniano eram sapateiros que distribuíam caridade e também se converteram... A coincidência nas duas histórias está na conversão dos irmãos e no auxílio aos pequeninos e menos favorecidos. Outro porém, é a época em que eles viveram: século III, que representa o começo do Cristianismo como religião.
Como a Umbanda saúda a todos os Espíritos, sejam de crianças, de índios ou de outras raças, incluiu em sua Festa de Ibeji todos os irmãos dos Santos Católicos, ou seja, os sete irmãos: Cosme, Damião, Doú, Talabe, Alabá, Crispim e Crispiniano - mesmo não sendo irmãos entre si...
Essa crença de oferecer uma Festa aos Espíritos Infantis tornou-se tão popular por ser uma homenagem:
- Em agradecimento à todas as crianças que deram a vida para salvar Jesus da perseguição de Herodes;
- Para honrar todas as crianças e inocentes que morreram nesses milhares de anos...
O número Sete é Cabalístico e faz referência à Hierarquia Celestial. Todos os Anjos são em número de sete, portanto, as crianças que morreram inocentemente, também são Anjos. Por isso, durante a festa sempre são distribuídos doces em quantidades iguais de sete.
Quanto a datas: São Cosme e São Damião são comemorados em 26 de setembro. Eles foram canonizados em 630. No Mundo todo, eles possuem datas diferentes de comemoração: 26 e 27 de setembro, 1º de julho e 1º de novembro. Eles foram mortos em 303, na Síria...
São Crispim e São Crispiniano são comemorados em 25 de outubro. Eles foram canonizados em 1645. Eram humildes sapateiros que seguiam o Cristianismo. Foram perseguidos e mortos durante o século III.
A Igreja Católica canonizou apenas os irmãos gêmeos: Cosme e Damião, Crispim e Crispiniano. Por conta disso, a Igreja aceita, apenas, a imagem dos santos com "dois irmãos" em sua iconografia - que representa que eles são gêmeos.
O costume de distribuir doces e guloseimas às crianças ocorre no dia 27 de setembro... Data que foi originalmente adotada pelo Candomblé e, depois, pela Umbanda.

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sexta-feira, 21 de setembro de 2018

A história de Claudia Soares de Castañeda.

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Eu prossigo agora com a narrativa do restante de minha história de vida...

"Claudia nasceu em solo espanhol, de uma família tradicionalmente católica. Os Soares eram famosos criadores de porcos de diversas raças, oferecidos aos banquetes reais, em comemorações diversas. Soares é um nome que deriva de Soeiro, que significa: "criador de suínos". Quando conheci Claudia ela estava com dez anos e eu já havia completado dezesseis. Apesar de ser uma menina, já era possível ver que se tornaria uma mulher de beleza exuberante.
Nossos pais realizavam troca de produtos e, durante suas negociações, eu e Claudia nos observávamos. Com o passar dos anos, nos tornamos amigos. Nossas famílias se visitavam e fomos aprofundando nossa amizade. Claudia já era uma moça e atraía a cobiça dos homens da região. Um jovem comandante da Coroa Portuguesa estava sempre rondando a família Soeiro, na tentativa de desposar Claudia.
Aqui, porém, houve uma grande reviravolta na história... Nessa época, Portugal e Espanha começaram a guerrear, disputando territórios, coroas e bens. Casamentos entre fidalgos foram desfeitos, gerando mais atrito entre os dois reinos. Quando as disputas começaram a ficar mais intensas, eu e meu pai decidimos evitar a região por um período. Então, fizemos uma última visita aos Soares, para deixar produtos excedentes.
Nós ciganos, somos muito intuitivos e minha mãe nos alertou para que não fizéssemos essa viagem, pois estava com maus pressentimentos. Mas, nós somos também muito persistentes e quando nos decidimos, agimos de qualquer maneira. Dessa forma, chegamos em Toledo, próximo ao Rio Tejo. Quando nos aproximamos de Alcázar de Toledo, percebemos vários frontes de guerra. Então, decidimos seguir durante a noite até a residência do Senhor Soares.
Com a escuridão da noite pudemos nos ocultar e chegamos à residência do Senhor Juarez Soares. Ele e a esposa Eulália estavam acordados e preocupados com a situação. E diante de tudo que estava acontecendo, nos pediram que tirássemos Claudia e seu irmão Ygor às escondidas, pois temiam por uma invasão. Ygor tinha a metade da idade de Claudia, mesmo assim, era esperto e corajoso. Os dois irmãos não queriam deixar a família. Portanto, era compreensível que não quisessem se afastar. Foi difícil convencê-los do perigo que corriam...
Logo que deixamos a fazenda percebemos ao longe uma invasão e labaredas de fogo consumindo a plantação mas, nada podíamos fazer. Os dois choravam muito. E nós, para protegê-los, tentamos nos afastar o mais rapidamente possível. Andando na surdina chegamos ao nosso acampamento. Minha mãe nos aguardava apreensiva, pois sabia que o pior havia acontecido.
Com o passar do tempo, Claudia e Ygor, acostumaram-se a vida local e passaram a conviver com as organizações diárias do acampamento. Porém, não ficávamos na mesma região por muito tempo e passamos a nos mudar mais frequentemente. E nossa vida prosseguia... Após certo período de adaptação, uma cerimônia de iniciação foi realizada para Ygor e Claudia, onde os dois passaram a fazer parte de nossa família cigana.
Assim, transcorreram sete anos, Ygor tornou-se um rapazote e Claudia era uma linda mulher. Em uma dança com punhais, joguei meu punhal ao chão, aos pés de Claudia. Ela o apanhou e guardou no meio dos seios. Depois dançou com uma flor na boca e a lançou para mim. Era um pedido de casamento. Ela aceitou e eu aceitei.
Dissemos sim em outra cerimônia realizada pelo Chefe de nossa Tribo, onde enchemos nossa taça de vinho e bebemos juntos. Fizemos o pacto de sangue e amarramos nossas mãos. Éramos um só. Dançamos e festejamos e todos comemoraram... Claudia era amada por todos. Quando nos recolhemos todos silenciaram e esperaram, como era costume. Mostrei o lenço e todos gritaram: Optchá!
Nove meses depois nasceu um menino lindo que se chamou Enrico, mas todos só sabiam dizer "Rico". Esses anos foram muito felizes mas, passaram rápidos. Até me esqueci das guerras e dos perigos... Então, Claudia ficou grávida mais uma vez. Uma menina, que não nasceu. Porém, descobrimos que foi melhor assim, porque as perseguições ao Povo Cigano (e aos demais povos) estavam se tornando cada vez mais efetivas. E nós começamos a nos esconder cada vez mais.
Chegou um momento em que a Europa ficou tão preenchida de soldados e Inquisidores, que seria impossível contar seu número. Muitas famílias Ciganas e de outras origens estrangeiras começaram a fugir da Europa para as Américas, por ser o mais longínquo de todos os lugares. Quando conseguimos preparar todo o acampamento e armar nossa fuga, fomos presos no Cais do Porto de Marselha. Alguns, ainda, conseguiram embarcar rumo ao Novo Continente. Eu e todos os meus familiares, fomos presos e levados ao calabouço.
Sem privilégios, sem água, sem comida e sem direito a julgamento. Fomos torturados por dias... Mas, de todos quem mais sofreu foi Claudia, ao ver Enrico acorrentado em um canto do calabouço, definhando aos poucos. Se ao menos ela pudesse abraçá-lo e confortá-lo... Uma criança pouco resiste em meio a tanto sofrimento, mas Enrico suportou olhando para a mãe. E Claudia cantou para ele uma canção de ninar e o viu partir...
Cada um de nós entregou-se aos poucos nos braços da Morte... Evitarei narrar os pormenores porque são fatos muito doloridos, para nós e para vocês que leem essa narrativa. Basta dizer que, quando fechei os olhos, Claudia ainda agonizava chorando por Enrico. Aqui preciso dizer que Ygor, irmão de Claudia, conseguiu escapar no momento de nossa captura. Mas, a história dele será contada em outro momento."

Pablo Juan de Castañeda

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